Friday, April 6, 2012

Benfica - o que melhorar para a próxima época?


É sempre difícil, arriscado e talvez injusto analisar os pontos a melhorar numa equipa que alinhou sem nenhum dos seus defesas-centrais e que estava com dois golos de desvantagem (no conjunto das duas mãos da eliminatória) quando um dos seus melhores jogadores foi expulso. Ainda assim, embora os encarnados tenham saído de Stamford Bridge de cabeça erguida, é precisamente isso que vamos fazer - porque há pormenores que podem - e devem - ser corrigidos, apesar da atitude guerreira do onze benfiquista.

Chelsea e Benfica ofereceram um espectáculo palpitante na passada quarta-feira, num encontro que apuraria o próximo adversário do Barcelona nas meias-finais da Liga dos Campeões. À imagem do que tinha acontecido na partida contra o Sporting de Braga, as águias não se importaram de partir o jogo ao meio, de modo a tirar proveito da lentidão da defensiva contrária. Como tal, ninguém terá sido surpreendido ao assistir, tal como no jogo contra os bracarenses, a um encontro recheado de oportunidades de golo, grandes defesas dos guarda-redes e um público da casa com os nervos à flor da pele.

No presente texto, iremos debruçar-nos sobre 3 questões particulares: posicionamento defensivo, situações defensivas de bola parada e transições defensivas. É justo dizer que o Benfica não teve a sorte do seu lado nos dois jogos, mas não é menos verdade que as equipas mais fortes da Liga dos Campeões tendem a castigar adversários com menor potencial precisamente nesses "detalhes" de menor importância, à primeira vista. Se as águias têm como objectivo capitalizar a experiência adquirida ao longo desta época, deverão ser suficientemente humildes para reconhecer que existe uma diferença considerável entre o futebol português e a prova mais importante a nível europeu - quanto mais depressa o admitirem, mais rapidamente se tornarão um clube a ter em conta por mérito próprio.

1. Posicionamento defensivo. O Benfica é muitas vezes louvado pelo seu implacável futebol de ataque, uma abordagem que quase teve a sua recompensa na passada quarta-feira. No entanto, uma boa cobertura e posicionamento defensivos constituem uma base em que qualquer clube com aspirações de grandeza deve assentar. Independentemente dos danos que tanto Bruno César como Maxi Pereira possam infligir no campo do seu adversário, é igualmente importante que sejam capazes de dominar as suas tarefas defensivas - algo em que nem sempre têm sido bem sucedidos ao longo desta temporada.

Maxi Pereira sobe para marcar Kalou, acabando por ficar lado a lado com Bruno César.
Note-se o espaço nas costas dos dois jogadores, com uma cobertura reduzida por parte de Javi García.

Kalou desmarca-se com uma simples "tabela". Javi García já vai atrasado para fazer a cobertura.


2. Situações defensivas de bola parada. É do conhecimento público que o Benfica semeia o caos com os seus lances de bola parada na zona ofensiva, mas é menos consesual que os comandados de Jorge Jesus são extremamente vulneráveis quando no outro lado da barricada. Recentemente, os vice-campeões nacionais sofreram golos neste tipo de jogada contra o FC Porto e Sporting de Braga (referindo apenas os jogos de maior dimensão) e, no último encontro, foram felizes ao não verem o Chelsea a marcar a partir de cantos, em particular. Apesar das recentes alterações promovidas por Jesus ao nível da marcação zonal, subsistem ajustes a fazer no sentido de vencer equipas mais fortes.

O Benfica insistiu em concentrar um grande número de jogadores na zona do primeiro poste.
Como resultado, David Luiz acaba por ficar sozinho, sem qualquer marcação. Note-se o espaço no segundo poste.

Após um mau alívio, Luiz recebe a bola sem marcação e quase sem oposição.
Capdevila acabou por evitar males maiores, nesta ocasião.

3. Transições defensivas. Muito provavelmente, o aspectomais importante no futebol moderno. A maioria das equipas sabe que é necessário retirar a bola da zona de pressão a seguir à sua recuperação, uma vez que não é expectável que os adversários tenham o mesmo número de jogadores no lado fraco (longe da bola). Os jogadores estão cada vez mais cientes de que a bola tem de rodar de um lado para o outro - de preferência de forma rápida -, no sentido de encontrar uma brecha. A questão que tende a separar as equipas nos dias que correm é a reacção ao momento em que perdem a bola. É verdade que não se trata de algo que apareça nos resumos, mas veja com os seus próprios olhos e analise com mais atenção. O facto de as melhores equipas serem geralmente as mais eficazes nas transições defensivas não pode ser coincidência - ou acha mesmo que o mérito do Barcelona (por exemplo) se baseia apenas no ataque?

Bruno César e Maxi em zonas avançadas do terreno. Nenhum deles faz falta para parar o contra-ataque.
O Benfica está prestes a ter sete jogadores à frente da linha da bola.
 
Javi García (o pêndulo da equipa, de punho fechado) faz a intercepção segundos mais tarde
e diz aos seus colegas que deveriam ter "matado a jogada" quando tiveram a oportunidade.

Note-se a diferença em situação inversa. Artur acaba de entregar a bola para um rápido contra-ataque.
Apercebendo-se de quantos jogadores do Chelsea estão à frente da bola,
Lampard faz rapidamente falta para parar a jogada.

Conclusão. Tudo isto que aqui foi escrito pode ser encarado como algaraviada táctica, mas, muitas das vezes, estes momentos são decisivos para o resultado de um determinado jogo. Embora o Benfica seja capaz de contornar a sua desatenção defensiva na maioria dos jogos do campeonato português, a Liga dos Campeões é muito mais competitiva - e os "tubarões" não se importam de esperar pelas suas presas.

Monday, April 2, 2012

O estranho caso de Hugo Viana


Ultimamente, inúmeros colunistas e comentadores têm caracterizado como pouco razoável a ausência de Hugo Viana do onze titular da equipa das quinas no próximo Campeonato Europeu (ou, pelo menos, a sua falta no grupo da Selecção).Com efeito, o médio bracarense tem vindo a revelar-se como provavelmente o melhor médio desta edição da Liga Zon Sagres e, como tal, é natural que se questione a sua ausência.

No futebol, como em tantas outras áreas, o contexto é fundamental. Quer se trate do treinador de um clube ou de um seleccionador nacional, é essencial que os jogadores contratados/seleccionados correspondam ao modelo de jogo do treinador, e não apenas em função das suas boas exibições no seu clube (anterior). Caso contrário, o treinador ver-se-á confrontado com um punhado de jogadores com pouco ou nada em comum, criando cenários caóticos que vemos com demasiada frequência no futebol (o caso de Gian Piero Gasperini no Inter vem imediatamente à memória*), nos quais o treinador tem em mãos a ingrata tarefa de tentar congeminar um qualquer modelo capaz de acolher todos os atletas. Se dúvidas houvesse, essa é a forma ideal para arruinar uma equipa e o respectivo treinador - bastando pensar na forma como Real Madrid, Liverpool, Chelsea ou Manchester City acabaram por gastar tanto dinheiro em contratações malogradas (de Wayne Bridge a Shevchenko ou Torres, de Robinho a Sahin, passando por Carroll ou Charlie Adam), clubes esses que tiveram uma enorme dificuldade em livrar-se desses activos. No caso das selecções nacionais, será suficiente pensar nos motivos que levam os próprios adeptos a criticarem os desempenhos de Messi, Ronaldo, Lampard ou Gerrard (entre muitos outros casos).

Por mais decisivo que Viana tenha vindo a ser na fantástica temporada do Sporting de Braga, é importante verificar se as suas características, qualidades e defeitos se adequam às ideias de Paulo Bento. Não é o objectivo do presente artigo concordar ou discordar das perspectivas do seleccionador nacional, uma vez que lhe compete a ele - e só a ele - tomar as decisões nos melhores interesses da equipa.

1. A táctica do Sporting de Braga. O Sporting de Braga de Leonardo Jardim joga habitualmente em 4x2x3x1, com Custódio como pivô defensivo e Viana por perto. Para além disso, Jardim conta com Lima, um avançado rápido e extremamente móvel, com Mossoró a assumir-se como a ligação entre meio-campo e ataque. Os passes teleguiados de Viana constituem uma alternativa a Mossoró, permitindo ao Sporting de Braga lançar rápidos contra-ataques circunscrevendo Mossoró com passes longos para a velocidade de Lima ou Alan. Defensivamente, os minhotos tendem a assumir uma postura conservadora, actuando com um bloco baixo com duas linhas de quatro. Existem diversos jogadores em torno de Viana para lhe fornecer a cobertura defensiva necessária quando se ausenta para um ataque, por exemplo.

2. A táctica de Portugal. Uma vez mais, esta questão não pretende discutir se se trata da melhor opção para Portugal, mas sim se Hugo Viana é uma escolha adequada. O onze português distribui-se num 4x3x3 há já algum tempo a esta parte. Paulo Bento tem mantido João Moutinho e Raúl Meireles no onze, recentemente com Miguel Veloso no lugar de Carlos Martins. Parece evidente que Bento tem em mente uma equipa capaz de pressionar em zonas mais avançadas quando tal for necessário, uma tarefa para a qual Hugo Viana não parece fadado. Ao contrário do Sporting de Braga, Portugal não dispõe de um típico n.º 10, o que significa que ambos os centro-campistas (à frente de Veloso) têm de defender e atacar - se analisarmos mais de perto as mais recentes convocatórias da Selecção, veremos que Paulo Bento tem convocado jogadores capazes de fazerem isso mesmo, tais como Meireles, Moutinho, Ruben Micael ou Ruben Amorim. Os próprios casos de Castro ou André Santos ficam a dever-se precisamente por satisfazerem os requisitos. Com tantos jogadores de características ofensivas na linha mais recuada (João Pereira e Fábio Coentrão, por exemplo) e extremos que raramente contribuem defensivamente (Nani, Ronaldo, Quaresma), compete aos médios fornecerem a cobertura defensiva, e não o contrário.

3. A abordagem de Portugal. Com base no percurso de Paulo Bento até agora, parece lógico assumir que a abordagem do seleccionador divergirá da de Carlos Queiroz. Em vez de esperar pelos seus adversários, a Selecção procurará abafar os adversários e jogar com uma linha defensiva (mais) subida. Uma vez mais, tal não joga necessariamente a favor de Hugo Viana, um jogador particularmente atreito a acusar sinais de cansaço à medida que o jogo se desenrola e que não costuma apreciar jogar em equipas nesse molde. Para além disso, Viana é vulnerável em situações de jogo mais físicas (conforme foi evidente na eliminatória contra o Besiktas), uma ameaça com que se depararia na maioria dos encontros do Campeonato Europeu.

Conclusão. Em resumo, não creio que se trate de um caso em que um treinador teimoso não aceita admitir o erro do seu primeiro julgamento, mas sim de um caso em que o jogador em questão não casa bem com a táctica e abordagem da equipa. Para colocar a questão em perspectiva, por mais importantes que estes jogadores sejam nos seus clubes actuais, seria irrazoável o Barcelona contratar Luisão, o Milan recrutar James Rodríguez ou o Manchester City recorrer aos préstimos de Matías Fernández - os princípios das equipas e as características dos jogadores não combinam, pura e simplesmente. Pessoalmente, considero que Hugo Viana poderia revelar-se um jogador precioso (particularmente em encontros em que Portugal não se assumisse como claro favorito), mas creio que os seus minutos de jogo seriam limitados.

*Gian Piero Gasperini foi contratado pelo Inter no início da presente época, sendo despedido após cinco jogos (sem vitórias). A ironia do despedimento foi o facto de tal se ficar a dever à implementação do modelo de jogo do treinador italiano (muito intenso e sabidamente de pressão alta), um modelo que não se adequava de todo aos jogadores à sua disposição - quase todos eles na casa dos trinta.

Sunday, April 1, 2012

Num jogo surpreendentemente aberto, Benfica vence ao cair do pano


Equipas e movimentações iniciais

No passado sábado, Benfica e Sporting de Braga defrontaram-se no primeiro dos três jogos que se disputarão em pouco mais de uma semana que poderão decidir de uma vez por todas o vencedor do campeonato português. Cientes da vitória do FC Porto conquistada poucos minutos antes do apito inicial, ambas as equipas sabiam que vencer esta partida era absolutamente fundamental. Como tal, não se assistiu a um jogo fechado, mas sim a um encontro inacreditavelmente aberto que qualquer uma das equipas poderia ter ganho.

O confronto da noite passada constituiu o derradeiro exemplo do melhor que ambos os clubes tinham a oferecer. Por um lado, o Benfica manteve o proverbial pé no acelerador (talvez tentando compensar a performance menos exuberante da passada terça-feira contra o Chelsea) e jogou insistentemente ao ataque desde o começo. Por outro lado, o Sporting de Braga mostrou-se igual a si mesmo, defendendo de forma organizada e provando a sua mestria no contra-ataque.

Como habitualmente, a abordagem defensiva do Braga passou por um quase exemplar 4x4x2

Os encarnados tentaram abafar o seu adversário desde os primeiros segundos, com Rodrigo no lugar do suspenso Aimar. Na verdade, o avançado espanhol foi um dos motivos pelos quais as águias desfrutaram de um excelente início de jogo. Com efeito, não só jogou por trás de Cardozo, como insistiu também em descair para a ala esquerda, criando situações de superioridade numérica com a colaboração de Gaitán e Capdevila (o qual, jogando no lugar habitualmente ocupado por Emerson, ofereceu maior fluidez no jogo ofensivo da sua equipa). Por seu turno, o Sporting de Braga tinha claramente a lição bem estudada e, como tal, sabia por onde lançar os seus contra-ataques, particularmente pelo seu lado esquerdo, explorando o espaço que tanto Maxi Pereira como Witsel (o qual actuou em zonas mais avançadas do que o habitual, numa posição semelhante àquela em que actuou no jogo contra o Zenit em casa) deixavam nas suas costas.

Witsel (círculo vermelho) jogou mais à frente do que o habitual

O Benfica mostrou-se muito forte na recuperação da bola em pressão alta, tendo conseguido fazê-lo com frequência, particularmente durante a primeira parte. Contudo, quando os bracarenses conseguiam furtar-se à primeira zona de pressão e fazer chegar a bola a Hugo Viana, criavam situações ameaçadoras, encontrando imenso espaço e poucos defensores à sua frente. Estranhamente, um confronto tão aberto não dispôs de muitas oportunidades de golo durante a primeira parte.

Após sair da primeira zona de pressão do Benfica, os minhotos tinham muito espaço para explorar.
Note-se a quantidade de espaço e o número de adversários à frente de Mossoró.

A segunda parte trouxe consigo mais do mesmo, mas de forma ainda mais acentuada. Nenhuma das equipas podia dar-se ao luxo de perder mais pontos (nomeadamente a equipa da casa) e, como tal, foi sem surpresa que houve mais situações de golo nos primeiros 10 minutos da segunda parte do que em toda a primeira metade. Os encarnados mostravam-se ainda mais afoitos no ataque, abrindo espaços nas suas costas. Com Alan menos preso a amarras defensivas (durante os primeiros 45 minutos, foi apenas e só um médio-direito, em vez de um extremo), era impossível adivinhar quem marcaria o primeiro golo.

Aos 60 minutos, os comandados de Jorge Jesus começaram a acusar o cansaço, incentivando os forasteiros a tentarem a sua sorte e levarem mais do que o empate para o Minho, transformando o jogo num festim de situações de perigo. Ironicamente, o primeiro golo surgiria da marca da grande penalidade, imprudentemente cometida por Elderson ao cabecear Bruno César em vez da bola. Quatro minutos depois, o mesmo Elderson viria a redimir-se ao marcar na recarga a uma defesa de Artur, no seguimento de um livre marcado por Hugo Viana. O último golo apareceria de forma dramática no 92º minuto, numa altura em que o Sporting de Braga estava já defensivamente desequilibrado com as substituições de cariz ofensivo realizadas poucos minutos antes, na procura do empate.

Em resumo, foi algo estranho ver duas equipas com tão bons resultados recentes na Europa (as águias nos quartos de final na actual edição da Liga dos Campeões e os minhotos como finalistas vencidos da Liga Europa da época passada) - geralmente, um bom indicador da capacidade de controlar um jogo - a proporcionarem um jogo tão aberto. Em termos tácticos, foi interessante constatar que a partida de ontem foi um espelho fiel do desempenho das duas equipas ao longo da temporada - tanto nos aspectos positivos como negativos. Na verdade, este encontro não se assemelhou a um típico jogo do título português, mas sim aos jogos loucos entre os 5 primeiros classificados desta temporada na Premier League.