Equipas e movimentações iniciais
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Alguns jogos parecem efectivamente ser disputados no plano teórico. O triunfo de Portugal sobre a Holanda foi uma vitória da lógica. Num encontro inacreditavelmente aberto e repleto de oportunidades de golo, a organização lusitana levou a melhor sobre a desesperada tentativa holandesa de lançar avançados para resolver os seus problemas. Subsistem algumas questões: como é possível que uma partida tão decisiva tenha sido tão aberta e caótica? E terá Portugal aprendido as lições necessárias para quando enfrentarem equipas mais disciplinadas?
A selecção holandesa estava envolta em algumas dúvidas. O seu treinador manter-se-ia fiel ao seu plano de jogo dos dois encontros anteriores? Ou faria uso da sua formação mais ofensiva, incluindo Van der Vaart e Huntelaar? Como se verificou, Bert van Marwijk optou por dar ouvidos às vozes popular e optou pela segunda hipótese, apesar de algumas previsões. Na verdade, Van Marwijk revolucionou toda a equipa, desfazendo a parceria de Van Bommel e De Jong a meio-campo, substituindo o antigo médio do Barcelona e Milan por Van der Vaart, transferindo Sneijder para a esquerda e posicionando Van Persie no apoio a Huntelaar. Olhando para os onzes titulares e para o posicionamento da equipa holandesa nos primeiros minutos, era difícil não antever as crateras que se formariam, mas tudo isso faz parte da magia do futebol.
Portugal pareceu estranhamente surpreendido pela audácia do adversário, quase como se Paulo Bento não acreditasse realmente que o seu oponente pudesse ser tão ousado. Como tal, a selecção nacional mostrou-se algo confusa nas marcações até ao golo holandês. Em vez do habitual jogo estéril de fogachos individuais, a presença de Van der Vaart dava à Holanda a saída de bola de que necessitavam para as transições, deixando De Jong exclusivamente para tarefas defensivas. Para além disso, com Van Persie a ocupar as áreas de Miguel Veloso, sobravam dúvidas sobre quem deveria acompanhar Van der Vaart e quem deveria deslocar-se para criar situações de 2x1 contra Robben.
Coentrão (amarelo) e Veloso (laranja) tentam impedir que Robben flicta para dentro,
abrindo espaços para Van der Vaart durante os primeiros 15 minutos.
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O golo holandês teve origem numa dessas situações, mas, por essa altura, já Portugal mostrava algumas melhorias. Com efeito, honra seja feita à selecção nacional por não perder a cabeça após sofrer um golo indesejado. Embora uma grande parte do seu plano de jogo passasse por permitir que os defesas-centrais contrários desfrutassem de tempo em posse e impedir que a bola entrasse no último terço (à imagem do jogo contra a Alemanha), os jogadores lusos conseguiram manter-se calmos e cingir-se à estratégia delineada - permitir que o adversário se partisse em dois e explorar as alas, sabendo que o contributo defensivo de Sneijder, Van der Vaart ou Robben seria quase inexistente. Verdade seja dita, este encontro assemelhou-se por vezes a dois encontros de 5 contra 5 disputados em duas metades distintas.
Apesar de não terem acertado em cheio no onze inicial apresentado pela Holanda, as nossas previsões não estiveram totalmente incorrectas. A selecção do país das tulipas não era propriamente sólida em termos defensivos com Van Bommel, o que significava que, sem o médio, as perspectivas holandesas ao nível defensivo apenas poderiam ficar mais negras. Na verdade, a linha defensiva holandesa permanecia questionável, no mínimo, e ficava ainda mais vulnerável às diagonais de Ronaldo nas costas, particularmente devido à sua lentidão e à falta de pressão sobre o portador da bola - uma boa descrição do primeiro golo português.
Com a Holanda disposta num invulgar 5-0-5, subsistem dúvidas sobre os quatro momentos do jogo foram suficientemente treinados durante o período que antecedeu o Europeu, dada a descoordenação patenteada pela maioria dos jogadores desde o início da competição. Embora Portugal tenha permitido que o jogo degenerasse para um rol de contra-ataques sucessivos, perigosamente semelhante a alguns jogos da Premier League, pairava no ar a noção de que a selecção nacional tinha maiores probabilidades de marcar (particularmente em contra-ataque) do que de sofrer um golo.
A segunda parte trouxe consigo nova revolução. Apesar de manter o mesmo onze, Van Marwijk realizou mais alterações, nomeadamente com o deslocamento de Van Persie para a direita, de Robben para a esquerda e de Sneijder para a posição de n.º 10. Embora seja verdade que o maestro do Inter ofereceu maior estabilidade e tentou fazer rodar a bola, os problemas defensivos permaneciam os mesmos, o que torna ainda mais difícil compreender ao certo a intenção do treinador holandês.
O meio-campo português foi heróico no acompanhamento das tentativas de penetração holandesas, mas Pepe esteve imperial, cobrindo as costas dos seus laterais quando estes eram batidos. Por seu turno, Miguel Veloso foi fundamental para que a equipa fosse sempre capaz de mover a bola de um lado para o outro e iniciar os contra-ataques. Após os primeiros 15 minutos da segunda parte, o jogo voltou a abrir e, tal como na partida contra a Dinamarca, Portugal deveria ter resolvido a questão muito antes. Felizmente para a turma das quinas, a Holanda estava já desfeita e dependia em exclusivo das diatribes individuais de um dos seus avançados.
Com Robben à esquerda, Willems ficou ainda mais exposto e Portugal tinha ainda maior liberdade para explorar esse mesmo flanco através de Moutinho, Nani e João Pereira. Como seria de esperar, as combinações de passe mais frequentes dividiram-se entre esses jogadores. Quase parecendo querer agravar a situação, o treinador holandês decidiu-se por uma abordagem ainda mais temerária e por uma defesa a três, com Robben e Afellay como médios-ala. Portugal limitou-se a esperar pela Holanda e a insistir pelas alas, ciente de que uma das inúmeras oportunidades acabaria por entrar.
Há algumas conclusões importantes a retirar deste encontro. Antes de mais, assistimos a uma prova definitiva de que o talento por si só não é suficiente para ganhar jogos. É verdade que a Holanda dispõe de imenso talento em algumas posições, mas a falta de solidariedade e de ideias colectivas é o caminho certo para o insucesso de qualquer equipa. Em segundo lugar, é difícil vislumbrar o motivo pelo qual a nação vice-campeã do mundo, conhecida pelo seu pensamento futebolístico de vanguarda, parece tão afastada do futebol moderno, tanto ao nível de clubes como de selecções. No que diz respeito a Portugal, convém extrair igualmente algumas ilações. A mais importante tem a ver com Ronaldo: o capitão português necessitava de uma partida assim. Dois golos, um remate à barra, inúmeras oportunidades de golo e muito espaço para correr serão razões mais do que suficientes para que o avançado do Real Madrid supere erros passados. A segunda questão prende-se com a maior rapidez de Paulo Bento na introdução de Custódio, em comparação com o encontro contra a Dinamarca.
No entanto, restam alguns pontos de interrogação. Como se comportará esta equipa contra equipas mais sólidas? Portugal continua a não dispor da capacidade de controlar o jogo quando está à frente no marcador, expondo-se dessa forma a um qualquer incidente aleatório, por exemplo. Por último, o treinador português necessita de abordar a marcação zonal nas situações de bola parada, a qual não está a funcionar na perfeição. Apesar da mais recente vitória, seria imprudente pensar que não existem na selecção nacional áreas que necessitam de melhorias urgentes.
Chalkboards criados através da app Stats Zone, disponível gratuitamente na App Store.
Ronaldo disputa o lance aéreo, arrastando o lateral.
Note-se o espaço à frente de Coentrão (amarelo).
Postiga (azul) apenas tem de criar uma distracção.
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Ronaldo penteia a bola para Coentrão e o lateral depara-se com um simples 1x1.
Note-se como a última linha defensiva holandesa está desprotegida.
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Com a Holanda disposta num invulgar 5-0-5, subsistem dúvidas sobre os quatro momentos do jogo foram suficientemente treinados durante o período que antecedeu o Europeu, dada a descoordenação patenteada pela maioria dos jogadores desde o início da competição. Embora Portugal tenha permitido que o jogo degenerasse para um rol de contra-ataques sucessivos, perigosamente semelhante a alguns jogos da Premier League, pairava no ar a noção de que a selecção nacional tinha maiores probabilidades de marcar (particularmente em contra-ataque) do que de sofrer um golo.
Portugal fez quase o dobro de recuperações da Holanda.
A distribuição das recuperações holandesas é quase idêntica à partida da Alemanha. |
O meio-campo português foi heróico no acompanhamento das tentativas de penetração holandesas, mas Pepe esteve imperial, cobrindo as costas dos seus laterais quando estes eram batidos. Por seu turno, Miguel Veloso foi fundamental para que a equipa fosse sempre capaz de mover a bola de um lado para o outro e iniciar os contra-ataques. Após os primeiros 15 minutos da segunda parte, o jogo voltou a abrir e, tal como na partida contra a Dinamarca, Portugal deveria ter resolvido a questão muito antes. Felizmente para a turma das quinas, a Holanda estava já desfeita e dependia em exclusivo das diatribes individuais de um dos seus avançados.
Com Robben à esquerda, Willems ficou ainda mais exposto e Portugal tinha ainda maior liberdade para explorar esse mesmo flanco através de Moutinho, Nani e João Pereira. Como seria de esperar, as combinações de passe mais frequentes dividiram-se entre esses jogadores. Quase parecendo querer agravar a situação, o treinador holandês decidiu-se por uma abordagem ainda mais temerária e por uma defesa a três, com Robben e Afellay como médios-ala. Portugal limitou-se a esperar pela Holanda e a insistir pelas alas, ciente de que uma das inúmeras oportunidades acabaria por entrar.
João Pereira e Moutinho constituíram a segunda combinação mais frequente de Portugal.
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Moutinho e Nani constituíram a combinação mais frequente de Portugal,
muitas vezes com Moutinho a fazer passes de ruptura para Nani. |
No entanto, restam alguns pontos de interrogação. Como se comportará esta equipa contra equipas mais sólidas? Portugal continua a não dispor da capacidade de controlar o jogo quando está à frente no marcador, expondo-se dessa forma a um qualquer incidente aleatório, por exemplo. Por último, o treinador português necessita de abordar a marcação zonal nas situações de bola parada, a qual não está a funcionar na perfeição. Apesar da mais recente vitória, seria imprudente pensar que não existem na selecção nacional áreas que necessitam de melhorias urgentes.
Portugal não tem estado bem a defender situações de bola parada, especialmente no segundo poste.
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Chalkboards criados através da app Stats Zone, disponível gratuitamente na App Store.
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